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sábado, 27 de abril de 2013

Clarice Disse ou Não Disse?


Em Junho deste ano completarei 28 anos de casado. Eu lembro de encontros de jovens na Igreja que eu participava quando solteiro onde casais apresentavam seus testemunhos. O maridão de um desses casais dizia que o segredo da felicidade na vida a dois estava na conquista diária e que esta conquista tinha ser realizada pelos dois.

E como todo assistente dessas palestras que apresentam conselhos e sugestões para a felicidade, a dúvida já nascia em entender “conquista diária”. Afinal a gente busca conquistar o que não se tem. Então se eu tenho o amor a dar e a sua recíproca, o que conquistar? Além disso, ficou a impressão do curto prazo da duração da conquista, afinal o conselho era de ser diária.

As dúvidas não eram só essas e iam longe no pensamento. Por acaso a sua esposa ou esposo, após a sua atividade de conquista lhe dá um sinal ou um aviso “Ok, hoje você me conquistou”? Borboletas voam, flores caem do céu e fogos explodem logo após a afirmação da sua cara metade?

Enfim mais do que um testemunho o recado ali estava bem dado: Vida em casal não é fácil.

Afinal conseguir harmonia em divergências individuais é uma ação tão complexa a qual duvido que o Freud explica. Já o Jung nem discute. A sua afirmativa sobre o tema é desanimadora: “Até mesmo o melhor dos casamentos não consegue nivelar tão perfeitamente as diferenças individuais, a ponto de tornar condições dos cônjuges absolutamente idênticas.”.

Contudo, apesar da complexidade da vida em casal, muitos vivem juntos por muito tempo e cada casal tem a sua fórmula de sucesso.

No meu, a fórmula do sucesso é uma complexa mistura a qual não tem medidas certas de proporcionalidade dos ingredientes: Amor, Amizade, Cumplicidade, Respeito, Carinho, Querer ficar junto, Querer fazer mimos, Paixão juvenil e principalmente conversa e comunicação. Quanto a esses dois últimos itens, se o tema aqui fosse empresa, seria planejamento e ação.

Isso mesmo, de certa forma o segredo para um bom casamento é planejamento e ação, ou seja, conversa e comunicação. Não adianta todos os demais ingredientes, se não houver um plano e sua respectiva ação para o objetivo comum do casal, ou seja, manter a vida a dois de forma plena e feliz.

E para que o planejamento e ação? Lembram das palestras da minha juventude? Então, em nenhuma delas foi apresentado como enfrentar as dificuldades financeiras, as de saúde, as de relacionamento com as pessoas em nossa volta, sejam elas parentes ou não, mas com forte influência na relação do casal. Não há dicas de como enfrentar as dificuldades da paternidade e da maternidade. Enfim, não há uma fórmula geral com uma super solução para todos.

Assim, passados 28 anos de um casamento feliz, o meu aprendizado confirma a minha teoria de planejamento e ação ou a de conversa e comunicação. Eu e minha querida esposa já enfrentamos inúmeras dificuldades e várias eram suficientes para encerrar nossa relação. 

No entanto, nosso objetivo principal sempre foi proporcionar ao outro o máximo de contribuição para a felicidade. 

Com isso, mesmo sem ser algo estruturado, nossas ações eram voltadas para o planejamento, identificando o problema ou a dificuldade prejudicial a nossa relação e buscando a solução, ou seja a ação. 

Apesar disso, muitas vezes foi necessário rever se a ação era eficaz e alterá-la. Mas, evidente que nada disso é assim via um check list na base do “se” tal coisa acontecer, “então” faça isso. Quero dizer, é muito intuitivo e não lógico embora pareça.
Escrever isso agora é fácil, posso até me tornar um palestrante e junto com a minha esposa, quem sabe seremos colegas ou concorrentes do famoso casal do casamento blindado. Tudo bem que a minha esposa não é filha de Pastor. Mas, isso seria apenas mais uma dificuldade que certamente seria superada.

No entanto, já que estou hoje escrevendo meio sem querer sobre dicas de vida a dois gostaria de participar um recente evento. Como todo bom homem da relação, o qual tradicionalmente é considerado o perturbador da paz conjugal, numa dessas conversas de planejamento e ação (lembrando sem perceber), eu estava argumentando com minha esposa que ela não anda entendendo o que falo e coisa e tal...

Eis que recebi dela um fulminante olhar, daqueles que produzem raios lazer capazes de perfurar paredes e a sua oca cabeça. Confesso: gelei...

Então ela contra responde: Sabe o que eu acho? Leia isso aqui.

O “isso aqui” era um texto atribuído a Clarice Lispector com sugestivo título “Não te amo mais”. Só com esse título já passei de gelado passei para estático. Eu não conseguia ler o restante do texto.

Fiquei parado olhando aquele título e pensando um monte de coisas sobre qual era a verdadeira mensagem que ali estava embutida.

Na sequencia vem aquela pergunta: Já leu? Respondi: Não consigo. E como toda boa esposa, a ordem: Deixa de frescura e leia o texto (de fato eu estava bem fresquinho de tão gelado).

Então comecei a ler:

Não te amo mais
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis
Tenho certeza que
Nada foi em vão
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada
Não poderia dizer mais que
Alimento um grande amor
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...
Não te amo mais

Silêncio na sala. Eu já tinha desligado a TV e agora o maior barulho do ambiente era o bombar do meu coração.
E aí, já leu? Perguntou a querida esposa. Li, sim. Respondi, (detalhe: gelado, estático e sentindo minha pulsação em ritmo reduzido e muito provavelmente esbranquiçado.)

Então quase sem conseguir abrir a boca, questionei: O que significa isso?

Aí vem uma direta bem jeito de esposa: Você leu direitinho o texto? Sim, li, já não falei? E volto perguntar o que significa isso?

Agora, meu marido, leia de baixo para cima.

Na hora achei a ordem ridícula, mas eu não estava em condições de discutir a regra da leitura e comecei a ler de baixo para cima:

É tarde demais 
Sinto, mas tenho que dizer a verdade 
Eu te amo! 
E jamais usarei a frase 
Já te esqueci! 
Sinto cada vez mais que 
Alimento um grande amor 
Não poderia dizer mais que 
Você não significa nada 
Sinto dentro de mim que 
Nada foi em vão 
Tenho certeza que 
Ainda te quero como sempre quis 
Estarei mentindo dizendo que
Não te amo mais 

Então querido marido, onde é que não estou entendendo o que você fala e coisa e tal?

Esquece minha querida. Eu também amo você e muito. Me dá um abraço. Isso foi tudo o que consegui responder após a tensa leitura do que Clarice disse ou talvez não disse.

Se meu casamento é blindado, eu não sei. Se a Clarice disse isso tudo, também não sei.

O que sei é: não é fácil viver a dois. No entanto estou certo de que toda a dificuldade quando vencida pelos dois se transforma em felicidade para ambos.

Um abraço a todos os casais

Como não poderia deixar de ser dedico este texto a minha querida esposa.




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