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quinta-feira, 28 de março de 2013

Pilatos



A sexta feira santa é marcada por uma das mais emocionantes cerimônias do cristianismo, em especial a celebrada na Igreja Católica. O momento da morte de Jesus na Cruz é um dos mais emocionantes e certamente de maior representação da força da fé Cristã, afinal depois de martírio, dor e sofrimento, Jesus vencerá a morte e ressuscitará.

Mas, pouco antes de sua condenação a morte na cruz aparece um personagem o Governador local Pilatos. Aquele que lavou as mãos e a simbologia deste ato o transformou em marca de quem não quer assumir uma responsabilidade.

Qual pecado, ou melhor, onde está o erro em não querer assumir uma responsabilidade que conscientemente você sabe que não é sua. A responsabilidade está por ai pairando nos ares e você a acolhe e a assume, sabendo que não é sua, é assim que funciona? É assim que nos comportamos? Se hoje não, então porque naquele momento deveria Pilatos assumir a libertação de Barrabás e a condenação de Cristo sem ser ele o autor dessa sentença?

A atitude de Pilatos é tão distorcida na historia permitindo liberdades poéticas como a de Ivan Lins em sua extraordinária canção “Daquilo que eu sei” onde registra: “Só não lavei as mãos e é por isso que me sinto cada vez mais limpo.”

Em rápida leitura e lembrança ao que consta nas escrituras podemos aqui inferir que Pilatos se sujou ao lavar as mãos. Em minha opinião esta é uma posição muito cômoda, pois acredito que o próprio Ivan Lins lavaria suas mãos em situação semelhante, ou seja, em situação de assumir uma responsabilidade que não é a sua.

Em Mateus 27, 24 Pilatos expõe a sua situação ao afirmar: “Sou inocente do sangue deste homem.”
A ideia aqui não é julgar Pilatos e tão pouco defendê-lo, o objetivo é destacar a incômoda situação na qual ele estava e que muitos de nós já até passamos e tomamos atitude igual. Porém no momento do cerimonial religioso o colocamos como mais um dos homens maus que contribuíram  com a crucificação de Jesus.

Contudo, há um ponto de extremamente interessante no diálogo entre Pilatos e Jesus, registrado no Evangelho de João  18, 37 “Perguntou-lhe então Pilatos: És, portanto rei? Respondeu Jesus: Sim, eu sou rei. É para dar testemunho da verdade que nasci e vim ao mundo. Todo o que é da verdade, ouve a minha voz. 

Disse-lhe Pilatos: QUE É A VERDADE?...”

Nas Sagradas Escrituras não consta essa resposta. Aliás, esta parte do diálogo só está relatada por João. Não consta, em Marcos, Lucas e Mateus.

Enfim, não há registro na Bíblia de uma resposta para a pergunta de Pilatos “Que é a verdade?” E esta tem sido a principal dúvida do homem desde que descobriu sua capacidade de pensar no que o cerca. De duvidar, questionar e não simplesmente aceitar, embora isso talvez seja a tendência da grande maioria dos humanos.

O curioso é se ver não somente na posição de Pilatos, mas ter ao mesmo tempo sua dúvida. E assim mesmo, o considerar um vilão. Vilão esse que tem forma de pensar e agir semelhante a nossa.
E o que é a verdade? O famoso grupo musical brasileiro, Titãs, tem na abertura de uma de suas músicas no CD Acústico, a seguinte explanação: “Meu pai me disse para nunca mentir, mas ele esqueceu de me dizer a verdade.” Aqui fica registrada a revolta do filho com a ausência da resposta da verdade o qual esperava ter de seu pai, seu ídolo, seu líder, a sua referência de vida.

Já mencionei, de forma bem influenciada por Descartes, de que se penso, logo existo, então tudo o que penso pode ser verdadeiro. Então o que sonho também o é? Então a verdade pode ser o que eu quiser e daí transmiti-la da forma que melhor for conveniente para mim e daí para conquistar territoriais é muito mais fácil que se possa imaginar. Então imagine, o quanto os diversos governantes que temos nos colocam suas verdades.

O que é a verdade? 

É aquilo que nossos pais e avós nos transmitem? É o que nossos professores nos ensinam? É o conteúdo das propagandas políticas? É que publicam no Facebook?

Para o Professor Peter Berger em seu livro Perspectiva Sociológicas, publicado em 1963, cada geração é refém da geração anterior. Assim, cada geração que nos antecedeu transmitiu um conceito da  verdade. E a cada geração conforme os interesses a verdade foi sendo calibrada, tratada, alinhada e trabalhada. Enfim se uma verdade pode ser assim trabalhada então deixa de ser verdade.

A partir disso posso concluir que o que recebi como verdade pode não sê-la. E assim com tantas outras gerações anteriores a nossa igualmente reféns nem sabem e nunca souberam o que era verdade e o que nos transmitiram é o mesmo que transmitimos as nossas gerações sequentes, que nada mais é do que um monte de conceitos ajustados a nossos interesses e conveniências e nem um pouco comprometidos com a resposta a pergunta de Pilatos.

Para George Hegel, filósofo alemão em seu livro Introdução a História da Filosofia, publicado em 1816 destaca que o o homem demorou quase 2.000 anos para começar a pensar sobre o que o cerca.

E entendo que ainda estamos gatinhando em termos de desenvolvimento dos nossos pensamentos, pois somos escravos de gerações anteriores e como a verdade não é material é um conceito totalmente subjetivo sem experimentos que o comprovem é portanto, sujeito a ajustes de forma a atender os mais diversos interesses.

Nesse aspecto Elis Regina na canção “Como nossos pais” é contunde ao cantar: “ Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como no os nossos pais”.

A verdade, se é que ela existe, permanece sem reposta para Pilatos, para mim e para você. E a dor  é perceber que talvez essa resposta não exista e que a verdade em si também não exista.

Um abraço a todos,

Figura:  Representação de Ecce Homo ("Eis o homem"), pintura de Antonio Ciseri, representando a apresentação de Jesus Cristo por Pilatos à população de Jerusalém. Extraído de http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%B4ncio_Pilatos.

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